Em um contexto de aceleradas mudanças ambientais, sociais, e tecnológicas, é importante a construção de valor a longo prazo
Desenvolver uma agenda positiva, focada na construção de longo prazo, de forma sustentada e que leve à perenidade e a competitividade, é o “Santo Graal” das organizações. No Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa existe um vasto material sobre os caminhos estratégicos a seguir, resumindo que a reputação não é apenas uma questão de imagem, mas sim um reflexo das práticas e valores adotados pela organização, que demonstram a sua coerência e consistência com o seu propósito corporativo.
A percepção do ecossistema de stakeholders sobre esses fatores explica por que algumas empresas conseguem atingir uma boa reputação, enquanto outras organizações e setores, como o de mineração, por exemplo, ainda que invistam consideravelmente em comunicação, não conseguem alavancar uma boa avaliação perante a sociedade.
Seria fácil entender esse novo contexto se estivéssemos todos alinhados sobre o caminho a seguir. No entanto, persiste em nosso imaginário corporativo alguns conceitos que não encontram mais amparo no nosso “novo normal” repleto de novos e inesperados desafios a cada dia. Compartilho dois exemplos de estratégias bem diferentes entre si, representando visões antagônicas sobre objetivos relacionados com a gestão da reputação.
A primeira vertente de empresas que, infelizmente, representa uma boa parcela do nosso PIB empresarial, encara a reputação somente como uma estratégia clássica de mitigação de riscos. É fácil identificar essas empresas, bastando ler seus relatórios de sustentabilidade ou ouvir as entrevistas de seus líderes e perceber que o conceito de reputação aparece somente na seção dedicada à gestão de riscos corporativos, listada em conjunto com inúmeros outros, como os riscos trabalhistas, financeiros, ambientais, de compliance, entre outros.
Em sua visão de curto prazo, essas empresas investem apenas na prevenção, construindo processos, planos de contenção de danos e de gestão de crises. Elas agem muito movidas pelo desejo de garantir a manutenção de sua licença social, colocando pouco foco estratégico e energia para ganhar tração nesse tema. Nada além disso. Porém, como tudo na vida, existem pontos positivos e negativos nessa estratégia. Como ponto positivo, é natural entender que essa estratégia é relevante para os acionistas de forma geral, pois preserva o valor de mercado da organização, mas gera pouco ou quase nenhum impacto social positivo, não geram inovação e não criam diferenciais competitivos. Para facilitar a comparação, chamaremos esse grupo de “mitigadores”.
Por outro lado, cientes da sua relevância perante a sociedade e atentos aos seu propósito verificamos também um grupo de empresas que entende a reputação como uma jornada de aprendizados internos, de mudança cultural, de construção de vínculos e de fortalecimento da sua imagem pública.
Essas empresas, com uma postura diferente dos “mitigadores”, procuram exercer o relevante papel dos “construtores”. Elas desenvolvem oportunidades internas de aprendizado, de sensibilização do papel que cada colaborador tem dentro da organização na construção da reputação.
E, com a mesma intensidade desenvolvem oportunidades externas com seus clientes, fornecedores, parceiros e comunidades, em busca de novos futuros. Em alguns casos, essas empresas envolvem até mesmo os seus concorrentes, o que aprendemos a chamar de coalizão pré-competitiva. Elas se unem para modificar de forma conjunta uma realidade, somando esforços, orçamentos e expertises e, depois, logicamente, seguem individualmente suas estratégias de marketing.
Essas empresas, com a visão de “construtores”, decodificaram o novo contexto social, político, ambiental e social e, logicamente, entenderam que a nova equação de valor passa pela colaboração para a construção de uma realidade melhor para toda a sociedade e defendem que as empresas devem considerar e equilibrar os interesses de todos os seus stakeholders. Como ponto positivo, elas se concentram na construção de valor – e não apenas na gestão de risco.
Portanto, em um mundo repleto de mudanças e sobressaltos que trazem riscos a todas as organizações, a gestão da reputação é crucial para construir e manter a confiança dos públicos de interesse – diferenciar-se da concorrência, lidar com crises e garantir a perenidade da empresa. Com isso em mente, entendemos que a reputação, em seu conceito mais amplo, deveria ser uma diretriz de todos os conselhos de administração que, comprometidos com a criação de valor a longo prazo e perenidade, priorizam essa eficaz estratégia entendendo que traz resultados não somente para a organização, seus acionistas e colaboradores, mas de forma ampliada para toda a sociedade.
Não é utopia, mas uma decisão estratégica em seu conceito mais amplo. Como vimos acima, um mesmo tema contempla duas visões estratégicas bem distintas entre si. Pensando no que isso pode representar na evolução da cultura empresarial brasileira, torcemos por um universo corporativo com menos “mitigadores” e mais “construtores”.