¨As marcas precisam ter clareza sobre seu propósito no mundo e na sociedade. Gerenciar a reputação da marca está intrinsecamente ligado a isso.¨
Hoje, 26 de julho, marca o início oficial dos Jogos Olímpicos de Paris 2024. Nesta entrevista, Beth Lula, Consultora de Branding do Comitê Olímpico Internacional (COI) e ex-diretora de Marca dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016, oferece insights sobre o impacto transformador do branding em eventos de grande magnitude. Na conversa, ela explora como o branding molda a percepção e o sucesso desses eventos e discute o papel crucial das marcas envolvidas.
Confira:
– Para começar, poderia nos apresentar sua trajetória na área de branding?
¨Me formei em Comunicação Social na UFRJ, com especialização em Produção Editorial, mas migrei naturalmente para a área de branding há quase 25 anos. Comecei na Mesbla, depois passei pela Souza Cruz e Intelig, onde cuidei de patrocínios, incluindo o patrocínio do Comitê Olímpico Brasileiro (COB) para os Jogos Olímpicos de Sidney 2000.¨
¨Em 2002, o COB me convidou para montar seu departamento de Comunicação e Marketing. Desde então, me especializei em branding de grandes eventos, especialmente Jogos Olímpicos e Paralímpicos. Hoje, sou consultora para futuros Jogos Olímpicos e para o Comitê Olímpico Internacional (COI), desde minha saída dos Jogos Rio 2016.¨
– Qual é a sua visão sobre a importância da gestão integrada da reputação e marca para as empresas?
¨A reputação é crucial para construir e manter uma imagem positiva. Gerir a reputação de forma integrada é essencial para o sucesso a longo prazo, criando valor, mitigando riscos, fortalecendo relacionamentos e garantindo vantagem competitiva. Essa gestão envolve todos os stakeholders e é um processo complexo e de longo prazo, algo que muitas empresas esquecem em um mundo imediatista. As marcas devem ter claro seu propósito no mundo e para a sociedade, e gerenciar sua reputação faz parte disso.¨
– Os Jogos Olímpicos e Paralímpicos representam os maiores eventos esportivos do mundo. Qual é o impacto que um patrocínio a esses eventos pode gerar no brand awareness das empresas apoiadoras?
¨ O patrocínio é uma associação de imagem de mão dupla. Quando uma empresa patrocina um evento, ela se apropria dos valores daquele evento, complementando sua própria imagem. Os patrocinadores, com seus vastos recursos, amplificam a visibilidade do evento através de suas campanhas e ativações.¨
¨Essas grandes marcas não só injetam recursos cruciais, mas também potencializam a comunicação e o awareness do evento. O caso da Coca-Cola, patrocinadora mundial desde 1928, é emblemático. Sua associação com os Jogos Olímpicos ajudou a empresa a se tornar uma marca global, enquanto também promove os Jogos.¨
¨Lembro de um projeto da Intelig, onde patrocinamos o Time Brasil para os Jogos Olímpicos de Sidney 2000. Fizemos uma ação inovadora no programa Faustão, promovendo um sorteio para os usuários da empresa irem para Sidney, destacando a presença do Time Olímpico Brasileiro. Essa iniciativa ajudou a aumentar o awareness da participação do Time Olímpico Brasileiro nos Jogos Olímpicos de Sidney e do evento no Brasil.¨
– Você atuou como Diretora de Marca nos Jogos Rio 2016 e hoje é Consultora de Branding do COI. O que você percebe que mudou/evoluiu no campo do branding de lá pra cá e que fatores contribuíram?
¨A evolução do branding nos Jogos Olímpicos é notável, especialmente com o avanço digital. Hoje, é impossível imaginar os Jogos de Paris ou Los Angeles sem um forte componente digital.¨
¨Estou curiosa para ver como os futuros Jogos irão usar a Inteligência Artificial (IA) na preparação e comunicação do evento. A IA permite a criação de experiências altamente personalizadas, utilizando dados de comportamento dos consumidores para oferecer conteúdos customizados. Na Rio 2016, por exemplo, conseguimos introduzir uma personalização de conteúdo em nossas newsletters e aplicativos, além da presença em todas as redes sociais existentes na época. Agora, com os recursos da IA, podemos ir além.¨
¨Além da evolução digital, o pilar da sustentabilidade se tornou essencial. Paris, por exemplo, tem uma forte vertente sustentável. Empresas e organizadores devem garantir que os Jogos tenham uma pegada mínima no planeta, envolvendo todos os stakeholders de forma responsável.¨
¨A sustentabilidade também permeia os contratos de patrocínio, exigindo práticas responsáveis em toda a sua cadeia. Isto reflete uma mudança necessária na forma como os eventos são organizados e executados.¨
– Poderia citar um case de sucesso de uma empresa que, em sua opinião, tenha utilizado o patrocínio aos Jogos Olímpicos de forma estratégica e inovadora para fortalecer seu posicionamento de marca e sua reputação?
¨Para mim, o maior case de sucesso é o da Coca-Cola. Desde 1928, ela tem sido a patrocinadora mais antiga dos Jogos Olímpicos. Esse compromisso de longo prazo ajudou a solidificar sua presença global, associando valores positivos e humanos dos Jogos, como Respeito, Amizade e Excelência, ao seu negócio.¨
¨A Coca-Cola é inovadora em suas campanhas integradas. Em Londres, fizeram a campanha “Move to the Beat“, conectando música e jovens. No Rio, a campanha “Isso é Ouro” incentivava o público a compartilhar vídeos dos momentos mais valiosos de suas vidas.¨
¨Com seu poder de alcance, a Coca-Cola cria experiências de consumo interativas, como os hospitality centers e o pin trade, uma marca registrada da empresa. Em cada edição dos Jogos, fico de olho nas ativações da Coca-Cola, que fortalecem seu posicionamento como uma marca jovem e associada à felicidade.¨
– Na sua visão, e pegando como referência os Jogos Rio 2016, quais foram as tendências e oportunidades utilizadas na época e que deixaram um legado?
¨No contexto dos Jogos Olímpicos Rio 2016, tivemos a oportunidade de mostrar o melhor do Brasil ao mundo. Consultamos o mercado criativo brasileiro em projetos de grande repercussão, como na escolha da marca, mascote e tocha, com processos de concorrência claros e transparentes que foi sempre uma prática na jornada da área de Marcas dos Jogos Rio 2016. A marca dos Jogos Paralímpicos Rio 2016 foi a primeira multissensorial da história, e a tocha, com braille e um design pop-up inovador, destacou-se pela sua originalidade.
Criamos também novos pictogramas para cada esporte Paralímpico, algo que não havia sido feito antes e agora é uma prática padrão. Esses exemplos ilustram a capacidade inovadora dos profissionais brasileiros e deixaram um legado duradouro na área de branding e design.¨
Sobre Beth Lula
Consultora em gestão de marcas, com mais de 25 anos de experiência profissional. É graduada em Comunicação Social e possui mestrado com distinção acadêmica em Communications Management pela University of Strathclyde, Glasgow/Reino Unido.
Como Diretora de Marca dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016, foi responsável pelo que foi considerado um dos melhores cases de branding da história dos Jogos. Atualmente, é Consultora de Branding do Comitê Olímpico Internacional (COI) para os Comitês Organizadores dos Jogos Olímpicos (COJOs), tendo prestado serviços para os Jogos de Tokyo 2020, Beijing 2022, Paris 2024, Milano Cortina 2026 e Los Angeles 2028.
Fundou a Brands2Love e se dedica a desenvolver estratégias e experiências para que organizações e eventos possam comunicar seu propósito de marca, mover pessoas e gerar impacto positivo no mundo.